Livros jurídicos: conhecimento e mercado

Desde que eu comecei a trabalhar com textos jurídicos, já revisei, editei e ajudei a publicar muita coisa boa. Só para citar alguns dos livros que têm o meu dedo:


Os livros jurídicos sempre foram uma fatia importante do mercado editorial. Mas sabemos que a produção e o consumo de livros estão diminuindo assustadoramente no Brasil. Vejam estes números:

“Entre 2014 e 2018, a queda de exemplares vendidos foi de 65,8%! Em apenas quatro anos, o mercado editorial jurídico reduziu 2/3: de 14.285.422 exemplares, em 2014, para 4.887.361 exemplares, em 2018! Enquanto o mercado editorial jurídico reduziu 65,8% da quantidade de exemplares vendidos entre 2014 e 2018, o número de faculdades de Direito aumentou 18,14% e a quantidade de advogados ativos inscritos na OAB aumentou 31,73%! Esses são os números inacreditáveis do mercado editorial jurídico! Como um segmento cujo público relevante aumentou expressivamente — e sequer estou considerando a crescente quantidade de concurseiros em tempos de crise e de funcionários públicos — pode ter um decréscimo tão grande?” (Henderson Furst, Publishnews, 02/08/2019, citado com adaptações)

E sem dúvida nenhuma isso se reflete, num ciclo vicioso, na produção acadêmica e na produção do próprio Direito:

“Professores e orientadores de mestrado relatam que seus jovens pesquisadores não fazem leituras profundas, densas, em obras clássicas, mas se restringem àquilo que o Google arbitra de relevante a eles. Quanto aos advogados, o fenômeno da mudança de demanda não é muito diferente dessa que observamos nos universitários, vez que é consequência direta. Observa-se crescente oferta (e demanda) de conteúdos práticos e prontos, e isso é consumido pouco importando quem fez a referida peça ou se ela está atualizada com a complexidade normativa e jurisprudencial brasileira.” (Henderson Furst, Publishnews, 02/08/2019, citado com adaptações)

Sim: a realidade é terrível e as conclusões são assustadoras. Mas o que podemos fazer diante disso? Precisamos continuar insistindo! Muitas pesquisas excelentes continuam sendo feitas e precisam ser conhecidas pelo público leitor.

Talvez o formato das publicações possa ser diferente? Podemos publicar mais e-books, que, além de mais baratos (para leitores, autores e editoras), são mais simples de consultar, estudar e citar? As provas da OAB e dos concursos podem ter um formato diferente, que privilegie mais a reflexão? Os programas de graduação e pós-graduação podem trabalhar melhor a metodologia científica?

Não tenho respostas. Ninguém tem, ainda. Mas precisamos pensar nisso com urgência. Sem livros não existirá produção de conhecimento sólida. E um Direito que não tenha alicerce no conhecimento certamente perpetuará injustiças.

Os novos meios e o futuro dos livros

Todas as mídias que conhecemos passam por um processo que pode ser assim resumido:

  1. Invenção e desenvolvimento de suas possibilidades pelos pioneiros;
  2. Tentativa de tornar essa mídia um negócio lucrativo, via dois modelos: pagamento (destinatário paga pelo conteúdo) ou publicidade (destinatário não paga pelo conteúdo, mas aceita que as propagandas custeiem a sua produção) — sem falar de modelos com custeio indireto (via impostos, por exemplo) e de modelos mistos;
  3. Decadência da mídia, ou porque o pagamento do público não é suficiente para bancar os custos e dar lucro, ou porque o canal se encontra sobrecarregado de publicidade e conteúdo de baixa qualidade;
  4. Invenção de uma nova mídia, que reúne os prós e os contras das mídias anteriores e leva adiante o mesmo processo, em espiral.

O livro é uma mídia. Devido a suas características (filtro de conteúdo, custos de produção, distribuição em nichos ou em larga escala, etc.), o negócio dos livros vem passando por esse processo lentamente.

Entrevista com André Schiffrin no Roda Viva, um dos poucos programas da televisão brasileira que ainda se preocupa com a consistência do debate cultural

No início do rádio e da televisão, pensava-se que a alta cultura seria divulgada em massa para todos os cantos do mundo. O editor André Schiffrin nos lembra que podiam ser vistas peças de Sartre pela televisão. Hoje, porém, a televisão está tomada por programas pasteurizados em que os participantes jamais ouviram falar em Sartre.

Isso também está acontecendo com a Internet. Desde o início, seus criadores sabiam que o uso comercial deste meio levaria à sua decadência. E é isto o que vemos hoje: o fluxo esmagador de conteúdo gira em torno de um eixo retroalimentado pela publicidade, raspando a tábula da comunicação até não restar matéria para novas incisões. Até mesmo o debate em torno de questões políticas é feito desta maneira; basta ter em mente que a política se resume, na Internet, a slogans do tipo “Fora Fulano” e memes descontextualizados.

Em suma: ridicularizar para não explicar; infantilizar o debate para prender a atenção do consumidor; transformar a cultura em produto.

Apenas para dar um giro de maior amplitude antes de voltar à questão dos livros, é importante citar outros dois exemplos: o da música e o das notícias, sobretudo nas suas características que mais interessam para o problema central deste texto.

Os sebos se tornaram museus da produção musical em vinilA música, como conteúdo, vem sendo veiculada ao longo da história da humanidade por meio de diversos suportes. Os concertos apresentados em teatros e os shows apresentados em bares são meios de veicular a música. O disco de vinil e o CD são meios. Os formatos digitais (wav, mp3, flac) são meios. Os canais de distribuição e consumo (rádio, iTunes, Spotify) são meios. Cada um desses meios funciona como intermediário entre o músico, produtor do conteúdo, e o ouvinte. Duas características interessam para a questão dos livros:

  1. Há um preconceito corrente que supõe o seguinte: quanto mais primitivo o meio, maior a qualidade da produção. Assim, a música ao vivo seria melhor do que a música veiculada em discos, que seria melhor do que aquela veiculada em CDs e do que aquela veiculada em mp3. Mas essa ideia não é, necessariamente, verdadeira. Cada meio tem particularidades a serem exploradas pelos produtores; cada meio permite a criação de um conteúdo que explore as suas características particulares. Além disso, cada meio pode interagir com os demais, levando à transmidiação — assunto tão vasto que seria possível preencher vários livros sem esgotá-lo.
  2. Os modelos de sustentabilidade podem ser observados na comparação entre o rádio (tomado por propagandas e jabá) e os serviços de streaming (além de haver produtores de conteúdo exclusivo para este meio, o ouvinte pode criar a sua própria “rádio” e ouvir músicas sem jamais ser interrompido por uma única propaganda — mediante o pagamento de uma mensalidade).

A notícia, como conteúdo, também vem sendo veiculada ao longo da história por meio de diversos suportes. O principal elemento que interessa para este texto é o seguinte: todos os jornais expressivos da atualidade estão enfrentando a questão da sustentabilidade. Qual é a medida entre cobrar do leitor e veicular propagandas, a fim de garantir a produção contínua de conteúdo relevante e lucrativo?

É ingênuo pensar que o mesmo processo não acontece com a cultura letrada. Os livros nada mais são do que um meio de veicular textos escritos. Os jornais, as revistas, os tabloides, os pergaminhos, os panfletos, os folhetins, os blogs, o mural do Facebook, etc. — tudo isso são meios que servem (também) para veicular textos escritos. Cada um possui características que lhe tornam mais adequado para a veiculação de um conteúdo próprio. Devido às suas características, o livro é um meio ideal para a veiculação de textos grandes, sejam textos que contam a estória complexa de um grupo de personagens, sejam textos que desenvolvem um raciocínio complexo e com várias implicações. Assim, por exemplo, o surgimento dos romances, na história da literatura, está intrinsecamente ligado à consolidação do processo industrial de produção dos livros.

É difícil pensar seriamente nos blogs como meio adequado para a publicação de um romance. Mas já é mais fácil pensar nos e-books como meio adequado para isso — muito embora o e-book tenha particularidades que suscitem a reformulação do texto a fim de readequá-lo ao meio. Este é um movimento presente em toda a história da cultura: o desenvolvimento de um novo meio leva à produção de um novo tipo de conteúdo.

Portanto, mais do que pensar no que está acontecendo com os livros, é preciso pensar no que está acontecendo com a cultura letrada.

Qual é o equivalente moderno da Biblioteca de Alexandria?

Hoje em dia, já não se criam mais poemas épicos. Este era um formato corrente de contar estórias antes da disseminação e consolidação da escrita. Mais de dois milênios depois de as grandes epopeias gregas serem cantadas por aedos, algumas poucas epopeias escritas conviviam, no final da Idade Média, com novelas de cavalaria. A partir da produção industrial de livros, a literatura passou a ser dominada pelos romances e coleções de contos.

Atualmente, há uma convivência entre diversos meios e diversos tipos de conteúdo. Há folhetins sendo veiculados em sites como o WattPad. Há minicontos sendo veiculados em blogs. Há microcontos sendo veiculados no Twitter. E há sagas imensas veiculadas em livros (só para ficar nos exemplos mais populares: Harry Potter e As Crônicas de Gelo e Fogo).

O problema dos livros não é o surgimento de novos meios. Quer dizer: os e-books não vão extinguir o livro. Os meios convivem uns com os outros na medida em que o conteúdo próprio daquele meio continua a ser culturalmente relevante. Vale dizer: enquanto houver escritores escrevendo romances, haverá livros sendo publicados. E mais: há conteúdos que somente podem ser veiculados em livro: livros de arte e de fotografia, por exemplo, não podem ser desfrutados em formato digital tão bem quanto em um suporte físico. E isso nos leva a uma questão paralela, que é a da qualidade do trabalho de produção gráfica dentro do contexto editorial (os livros publicados pela Cosac Naify devem ser citados) — mas o assunto fica para outro texto.

O problema dos livros é a sustentabilidade do negócio editorial. Então, ao invés de choramingar contra os blogs e os e-books, é mais inteligente compreender como os grandes conglomerados midiáticos estão empenhados a reformular a lucratividade da cultura letrada e, nesse processo, estão enterrando os pequenos produtores (escritores, editores, gráficas e livreiros que atuam em pequena e média escala).

Sejamos claros: o problema dos livros é, por exemplo, a Amazon ter como objetivo negocial a extinção das livrarias; o problema é, por exemplo, que as editoras somente aceitem publicar manuscritos de autores consagrados, pois o departamento de contabilidade não sabe lidar com o risco de publicar um autor estreante; o problema é o público leitor se pautar pelas listas de mais vendidos; o problema é a verba cada vez mais escassa das bibliotecas públicas. E assim por diante.

O futuro dos livros não está assim tão vinculado aos novos meios. O que é crucial são os modelos de negócios.

Ao invés de procurar a luz no fim do túnel, que tal entender como os tijolos formam as paredes do túnel?

Não é possível pensar em termos econômicos sem pensar no seu correspondente jurídico: toda a economia capitalista possui uma relação umbilical com a legislação. O objetivo deste texto não é propor soluções, mas apenas redirecionar o debate em torno da questão do futuro dos livros e fazer um alerta: a legislação precisa proteger a cultura; do contrário, as forças do mercado irão soterrar a produção cultural.

Que tipo de proteção legal o mercado editorial brasileiro precisa desenvolver se quisermos que o livro (como meio de veiculação cultural) tenha um papel relevante em nosso futuro?

Afinal, como escrevem os escritores?

Há inúmeras formas de abordar o processo de construção de uma estória, tantas quanto há escritores e leitores.

Como escrevem os escritoresUma classificação muito popular atualmente divide os criadores entre aqueles que planejam todos os detalhes do texto antes de escrevê-lo e aqueles que simplesmente se sentam e escrevem sem nenhum planejamento prévio. O apelido de cada tipo varia. O roteirista português João Nunes adota a denominação “paisagistas” e “jardineiros”. No mercado editorial de língua inglesa, os dois tipos são conhecidos como “plotters” e “pantsers”.

O romancista turco Orhan Pamuk gosta de se referir aos dois tipos como “ingênuos” e “sentimentais” (seguindo distinção proposta por Schiller). Os artistas ingênuos são aqueles cuja arte flui naturalmente de sua mente, como se a melodia estivesse na ponta dos dedos do músico e este fosse apenas um instrumento da natureza. Já os artistas sentimentais são aqueles que refletem sobre o fazer artístico: um romancista consciente de que o romance que escreve possui um enredo; um músico consciente de que a melodia que toca possui uma forma abstrata, etc.

Meu caminho pessoal com a arte começou na música e, por isso, eu gosto de usar uma metáfora musical para diferenciar os dois tipos. O compositor-planejador (ou: paisagista, plotter) calcula matematicamente o efeito de cada nota musical, anotando o resultado desse cálculo em uma partitura para só depois testar ao piano se o efeito planejado ficou agradável. O improvisador (ou: jardineiro, pantser) senta-se logo ao piano e vai experimentando as teclas, ouvindo cada nota cuidadosamente para atender ao pedido que ela lhe faz: uma nota pede outra e assim por diante até que uma melodia surge espontaneamente.

Antes que você me critique por simplificar demais as coisas: nenhum criador é puramente de um tipo (há, entre um e outro tipo, todo um arco-íris de possibilidades híbridas — e há, é claro, aqueles criadores que não se submetem a nenhuma classificação). Esta simplificação do processo criativo tem como único objetivo facilitar a compreensão do processo criativo particular de cada artista. Na prática, quando criamos, as classificações não importam.

Além disso, é preciso reconhecer que os conceitos discutidos por Pamuk não correspondem inteiramente a essa classificação. É perfeitamente possível ser, ao mesmo tempo, um escritor improvisador e “sentimental”, isto é, escrever estórias sem um plano preliminar e ainda assim refletir sobre o fazer literário.

Stephen King é um dos mais conhecidos pantsers; segundo ele, “Construir um enredo é o último recurso do bom escritor e a primeira escolha dos tolos. A estória que resulta daí nós a sentimos como algo artificialmente trabalhado.” Esta declaração radical está no livro Sobre a escrita, um clássico da reflexão sobre o ofício do escritor.

J K Rowling - Order of the Pheonix plot tableNo outro extremo, também podemos citar um autor de sucesso, Ken Follett, conhecido por seu método de planejamento intenso. Segundo ele: “Como um aspirante a escritor, certamente você deve começar escrevendo um esboço. (...) Resolvem-se muitos problemas com um esboço. Será muito mais fácil corrigir seus erros se você escrever um esboço do que se você simplesmente se sentar e escrever “Capítulo Um” no cabeçalho de uma folha e seguir escrevendo a partir daí. Se você trabalha desta maneira, levará um tempo terrivelmente longo para corrigir seus erros. (...) O esboço apresenta, capítulo por capítulo, o que acontece no livro e contém minibiografias de cada um dos personagens. Mais importante, porém, apresenta, para mim e para os meus editores, quais são os dramas da estória.”

Para além das óbvias diferenças entre o método de cada escritor, percebe-se que métodos diferentes refletem obras diferentes. As estórias contadas por Stephen King giram em torno de um evento ou sentimento que faz emergir a verdadeira natureza de um pequeno grupo de personagens. Já as estórias de Ken Follett possuem enredos complexos, com diversos personagens que desempenham múltiplas funções na trama, cuja ação geralmente se estende por vastos períodos de tempo.

Mas os métodos não variam apenas entre autores diferentes. Um mesmo autor pode abordar cada uma de suas estórias de modos diversos. Ernest Hemingway descreveu da seguinte maneira seu processo criativo: “Às vezes você conhece a estória. Às vezes você vai criando enquanto escreve e não tem ideia de como vai ser. Tudo muda conforme a estória se move. É isso que faz o movimento que faz a estória. Às vezes o movimento é tão lento que nada parece estar se movendo. Mas há sempre mudança e há sempre movimento.”

Sem dúvida, cada escritor possui métodos particulares de criação, e sempre haverá aspectos positivos e negativos conforme o ponto de vista de cada observador. Se, por um lado, escrever de improviso propicia um texto mais natural e espontâneo, há alguns riscos.

Breaking Bad - s04e01 four actsAldous Huxley enfrentava o risco de se perder em encruzilhadas: “Eu trabalho em um capítulo por vez, encontrando meu caminho conforme sigo. Eu não sei muito bem quando se iniciam os eventos narrados. Eu só tenho uma ideia muito geral e, em seguida, a coisa se desenvolve enquanto estou escrevendo. Às vezes — isso aconteceu comigo mais de uma vez — eu vou escrever algo grande, então simplesmente não consigo encontrar o que preciso e sou obrigado a jogar tudo fora. Gosto de terminar um capítulo antes de começar o próximo. Mas nunca estou totalmente certo do que vai acontecer no próximo capítulo até que eu trabalhe nele. As coisas me vêm em gotas e, quando essas gotas vêm, tenho que trabalhar duro para transformá-las em algo coerente.”

Georges Simenon, autor de mais de trezentos livros, também lutava contra o risco de abandonar todo o trabalho: “Eu não sei nada sobre os acontecimentos quando eu começo o romance. (...) Eu não sei absolutamente nada sobre os eventos que ocorrerão mais tarde. (...) Dia após dia, capítulo após capítulo, vou encontrando o que acontece na sequência. Depois de eu ter começado um romance escrevo um capítulo por dia, sem nunca perder um dia. Porque há uma tensão, eu tenho que manter o ritmo do romance. Se, por exemplo, eu fico doente por 48 horas, sou forçado a jogar fora os capítulos já escritos. E eu nunca mais volto a esse romance.”

Planejar um texto antes de efetivamente se sentar para escrevê-lo ajuda a evitar dispersões, ajuda a manter o foco. Para E. M. Forster, autor de outra obra clássica sobre a escrita — Aspectos do romance —, “O romancista deve, segundo penso, sempre estabelecer em que momento se iniciam os eventos a serem narrados, e qual será o grande acontecimento. Ele pode alterar este evento conforme ele se aproxima; na verdade, ele provavelmente vai alterá-lo; de fato, provavelmente é melhor que ele o faça, ou o romance torna-se amarrado e limitado. Mas a sensação de ter uma massa sólida à frente, uma montanha a ser contornada ou penetrada, através da qual a estória deve de alguma forma ir, é um processo bastante valioso e, para os romances que eu tentei escrever, essencial.”

Norman Mailer - Harlot’s GhostVladimir Nabokov era um notório planejador: “O padrão da coisa precede a coisa. Eu preencho as lacunas das palavras cruzadas em qualquer linha ou coluna à minha escolha. Estes pedaços eu escrevo em fichas até que o romance esteja concluído.” Segundo Nabokov, Lolita “é um quebra-cabeça cuja composição e solução ocorrem ao mesmo tempo, por serem uma o espelho da outra, dependendo de como se olha”. Já Fogo pálido “está cheio de pistas que fico esperando alguém encontrar”. Ada, que resultou da junção de dois projetos distintos, “foi fisicamente mais difícil de compor do que os meus romances anteriores por causa de seu maior comprimento. Quanto às fichas em que eu escrevo e reescrevo as minhas coisas a lápis, foram utilizadas, na versão final do livro, cerca de 2.500 fichas que minha datilógrafa transformou em mais de 850 páginas.”

Por outro lado, se o planejamento dá ao escritor uma sensação de segurança e ajuda a evitar muitos tipos de bloqueio criativo, há sempre o risco de planejar demais e nunca começar a escrever. É preciso encontrar um equilíbrio! Muitas vezes temos apenas uma ilusão de planejamento e, quando finalmente nos lançamos ao texto, percebemos que toda essa preparação não passou de uma manobra astuciosa para nos autoenganar e adiar indefinidamente a escrita.

Truman Capote, vítima de um bloqueio criativo que durou mais de dez anos (planejou um romance em sete capítulos, Súplicas atendidas, mas concluiu apenas três antes de falecer), tinha consciência desse perigo: “Eu invariavelmente tenho a ilusão de que toda a trama de uma estória, seu começo, meio e fim, ocorrem em minha mente ao mesmo tempo — que eu estou vendo isto em um flash. Mas ao trabalhar efetivamente, ao escrever efetivamente, infinitas surpresas acontecem. Graças a Deus, porque a surpresa, a reviravolta, a frase que vem no momento certo “do nada” é a recompensa inesperada, esse empurrãozinho que nos dá a alegria necessária para continuar. Até um tempo atrás, eu costumava manter cadernos com esboços para estórias. Mas eu percebi que fazer isso de alguma forma amortecia as ideias na minha imaginação. Se a faísca é boa o suficiente, se ela realmente pertence a você, então você não vai esquecê-la — ela vai te assombrar até que seja escrita.”

Will Self - writing roomCertamente, poucos têm o privilégio de receber adiantamentos milionários para não escrever um livro polêmico. O efeito que as pressões cotidianas suscitam revela-se no método de Jack Kerouac: “Eu tive a ideia para o estilo espontâneo de On the road ao ver como o bom e velho Neal Cassady escrevia suas cartas para mim, tudo na primeira pessoa, rápido, louco, num estilo confessional, completamente sério, tudo detalhado. (...) Você reflete sobre o que realmente aconteceu, conta aos seus amigos longas estórias sobre isso, medita bastante sobre isso, você vai conectando as coisas em momentos de lazer, então quando chega a hora de pagar o aluguel novamente você se obriga a pegar a máquina de escrever, ou um caderno, e acaba com isso o mais rápido possível ... e não há mal nenhum nisso porque você já tem toda a estória delineada.” Entre outras características deste método, nota-se que é um híbrido entre planejamento e improviso.

Não importa que você seja um planejador ou um improvisador: qualquer método é válido para a escrita. No fundo, os procedimentos de cada escritor são um reflexo da sua personalidade. Porém, se eu posso te dar alguma sugestão realmente valiosa seria esta: tente incorporar à sua escrita alguns dos procedimentos do método oposto. Ou, nas palavras de Orhan Pamuk: “Quanto mais o romancista consegue ser, ao mesmo tempo, ingênuo e sentimental, melhor ele escreve.” Se escrever é um exercício de empatia, experimentar outros métodos é uma forma de vivenciar a personalidade do outro.

Em termos práticos, proponho o seguinte:

Se você é um planejador: após desenhar o esqueleto de cenas do seu romance e fixar o respectivo post-it em um quadro, escreva cada cena como um improvisador. Liberte-se do seu plano: apenas a palavra que você acaba de escrever determina a palavra seguinte, ouça a sonoridade de cada uma, aguce os sentidos para captar nas entrelinhas a direção que o texto vai tomando e apenas observe, deixe o texto criar vida própria. Não se preocupe: depois você poderá revisar o texto conforme o esboço preliminar; quem sabe, virá à tona uma reviravolta original que jamais poderia ter sido planejada!

Se você é um improvisador: depois de escrever livremente o primeiro rascunho do seu romance, releia o texto, anotando cada elemento narrativo (funções e dimensões dos personagens, reviravoltas da trama, possíveis ganchos, conflitos, etc.) e analisando a força, a originalidade e os eventuais caminhos que cada um desses elementos suscita — como um planejador faria desde o princípio. Observe se é possível fazer algum ajuste na motivação dos personagens, na estrutura da trama, etc., observe se é necessário amarrar alguma ponta solta e não tenha receio de recortar e reorganizar o texto de acordo com as conclusões da sua análise.

Caso você tenha dúvidas sobre um ponto específico do seu conto, novela ou romance e precise de dicas concretas direcionadas ao seu texto, sinta-se à vontade para nos enviar um e-mail. Teremos o prazer de fazer um orçamento que atenda às suas necessidades.

Guia do projeto de pesquisa

O projeto é parte do processo seletivo tradicional da pós-graduação no Brasil. Sua elaboração é uma etapa preliminar da pesquisa universitária. Cada instituição possui diretrizes e modelos particulares; o momento de apresentar o projeto e até a sua obrigatoriedade são variáveis.

Guia do projeto de pesquisaAqui você encontra subsídios para avançar na pós-graduação. Estas dicas são indicações gerais de metodologia científica e não suprem a consulta ao manual da faculdade.

O projeto se divide em introdução, referencial teórico, metodologia, recursos, cronograma e referências.

A introdução descreve o tema, formula o problema e aponta hipóteses para a sua solução, a ser explicada em termos objetivos, com sua respectiva justificativa.

O assunto a ser provado ou desenvolvido é o “tema” da sua pesquisa. Defina precisamente seus limites, evitando generalidades vagas.

A investigação científica inicia-se por curiosidade do investigador. Seu interesse o leva a formular questões práticas ou teóricas cujas delimitações técnicas (ou “problema”) determinarão os objetivos e a metodologia da pesquisa.

Suas hipóteses para resolver o problema orientarão a busca das informações capazes de explicar os dados obtidos. Por antecederem a confirmação dos fatos, serão testadas durante a análise do material coletado, podendo ser validadas, negadas ou modificadas.

Seu objetivo é compreender os resultados alcançados pelas ações a serem empregadas na abordagem do problema. Quais são, de forma clara e precisa, as ações que você desenvolverá para alcançar o seu objetivo?

Justifique-as. Por que devemos ter interesse e nos importar com a sua pesquisa? Qual será a sua contribuição para o debate científico? Trará algum desenvolvimento teórico ou prático? Quais são as possibilidades concretas de realizar a pesquisa? Responda e terá a sua justificativa.

É necessário comentar o referencial teórico, pois a ciência requer fundamentos. Faça um levantamento preliminar das fontes de informação (livros, artigos científicos, trabalhos acadêmicos, etc.) que te ajudaram a definir o objeto da pesquisa e selecione as que podem ser utilizadas para submeter as hipóteses ao teste pretendido.

Indique a metodologia que conduzirá a investigação. Cada pesquisa é desenvolvida com técnicas e procedimentos adequados a métodos e sistemas específicos, com seus respetivos instrumentos de coleta, organização, tratamento e análise de dados.

Caso a pesquisa demande financiamento, descreva as despesas, sua natureza e valores estimados. Se possível, apresente cotações. O investimento necessário para executar a pesquisa pode ser agrupado em três tipos de recursos: gastos com pessoal; materiais e equipamentos; e custos diversos (por exemplo, deslocamento e hospedagem). A elaboração de uma planilha ajuda a organizar e viabilizar a pesquisa.

O cronograma descreve o tempo necessário para cada atividade planejada. Em uma tabela, distribua as etapas da pesquisa em relação ao seu tempo de duração. Alguns exemplos do que pode ser incluído: pesquisa bibliográfica; fichamento de obras de referência; coleta e tratamento de dados; organização e preparação de rascunhos; qualificação; redação e consolidação do relatório final; revisão e formatação do texto; impressão e entrega do trabalho.

Por fim, crie uma lista com todas as referências citadas no projeto. Alguns programas de pós-graduação exigem também a apresentação de uma lista com a bibliografia preliminar, isto é, as fontes que serão consultadas ao longo da pesquisa. É importante que as listas obedeçam às regras de formatação exigidas pela sua faculdade (ABNT, APA, ISO, Vancouver, etc.).

Em alguns casos, o projeto ainda pode trazer anexos (não elaborados pelo autor) e/ou apêndices (criados pelo autor) — elementos opcionais que complementam ou fundamentam a sua argumentação.

Caso você precise de mais dicas sobre a elaboração e a formatação do seu projeto de pesquisa, sinta-se à vontade para nos enviar um e-mail. Teremos o prazer de fazer um orçamento que atenda às suas necessidades.